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Colunista l pe.arisilva@hotmail.com

PADRE ARI ANTONIO SILVA – Contra a exclusão

(Mc 1,40-45)

 

6º Domingo do Tempo Comum

 

Deus acolhe os impulsos:

De forma inesperada, um leproso “aproxima-se de Jesus”. De acordo com a lei, não pode entrar um contato com ninguém. É um “impuro” e deve viver isolado. Também não pode entrar no templo. Como vai deus acolher eu sua presença um ser tão repugnante? Seu destino é viver excluído. Apesar de tudo, este leproso desesperado se atreve a desafiar todas as normas. Sabe que está agindo mal. Por isso põe-se de joelhos. Não pode arriscar a falar com Jesus em frente. A partir do chão lhe dirige esta súplica: “Se quiseres, podes limpar-se”. Sabe que Jesus pode curá-lo, mas queria limpá-lo Atrever-se a tirá-lo da exclusão a que está submetido em nome de Deus?

Causa surpresa a emoção que a proximidade do leproso produz em Jesus. Não se horroriza nem recua. Diante da situação daquele homem, Jesus se “comove-se até as entranhas”. Transborda nele a ternura. Como não vai querer limpá-lo, ele que vive movido unicamente pela compaixão de Deus para com seus filhos e filhas mais indefesos e desprezados.

Sem hesitar, “estende a mão” para aquele homem “toca” sua pele desprezada pelos puros. Jesus sabe que isso está proibido pela lei e que, com esse gesto, está reafirmando a transgressão iniciada pelo leproso. A coisa é que o move é a compaixão: “Eu quero: sê limpo”.

É isto o que quer o Deus encarnado em Jesus limpar o mundo de exclusões que vão contra a sua compaixão de Pai. Não é  Deus quem exclui, mas nós. Doravante precisa ficar claro que não se deve excluir ninguém em nome de Jesus. Seguir Jesus significa não horrorizar-nos diante de nenhum impuro. Não negar a nenhum excluído nossa acolhida. Para Jesus, a primeira coisa não é a norma, e sim a pessoa que sofre. Colocar sempre é a melhor maneira de ir perdendo a sensibilidade diante dos desprezados e rejeitados.

Em poucos lugares o Espírito de Jesus é mais reconhecível do que nessas pessoas que oferecem apoio e amizade gratuita a prostitutas indefesas que acompanha pessoas com AIDS esquecidas por todos, que defende homossexuais da rejeição religiosa e social…Essas pessoas nos recordam que no coração de Deus cabem todos.

 

Estender a mão:

A felicidade só é possível ali onde nos sentimos acolhidos e aceitos. Onde falta acolhida, falta vida, nosso ser se paralisa, a criatividade se atrofia. Por isso, uma “sociedade fechada é uma sociedade sem futuro, uma sociedade que mata a esperança de vida dos marginalizados e que finalmente se afunda a si mesma” (JÜRGEN MOLTMANN).

São muitos os fatores que convidam os homens e mulheres de nosso tempo a viver em círculos fechados e exclusivistas. Numa sociedade na qual cresce a insegurança, a indiferença ou a agressividade, é explicável que cada um de nós tratemos de assegurar nossa “pequena felicidade” junto aos que sentimos iguais.

As pessoas que são como nós, que pensam e querem a mesma coisa que nós, nos dão segurança. Em troca, as pessoas que são diferentes, que pensam, sentem e querem de maneira diferente, produzem em nós inquietude e temor. Por isso as nações se agrupam em “blocos” que olham mutuamente com hostilidade. Por isso buscamos cada um de nós, nosso “recinto de segurança”, esse círculo de amigos, fechado àqueles que não são de nossa condição. Vivemos como que “na defensiva”, cada vez mais incapazes de eliminar distâncias para adotar uma postura de amizade aberta a todas as pessoas. Acostumamo-nos a aceitar os mais próximos, aos demais nós os toleramos ou olhamos com indiferença, se não com cautela e prevenção.

O gesto de Jesus adquire especial atualidade para nós. Jesus não só limpa o leproso. Ele estende a mão e o toca, rompendo preconceitos, tabus e fronteiras de isolamento e marginalização que excluem os leprosos da convivência. Nós seguidores de Jesus, precisamos sentir-nos chamados a trazer amizade aberta aos setores marginalizados de nossa sociedade. São muitos os que precisam de uma mão estendida que chegue a tocá-los.

 

Experiência sadia de culpa:

Não é preciso ter lido muito Sigmund Freud para comprovar como uma falsa exaltação de culpa invadiu, coloriu e muitas vezes perverteu a experiência religiosa de não poucos crentes. Basta mencionar-lhes o nome de Deus para que o associem imediatamente a sentimentos de culpa, remorsos e temos de castigos eternos. Parece-lhes que Deus está sempre ali para recordar indignidade. Essas pessoas se sentem seguras diante de Deus repetindo incessantemente: “Por minha culpa, por minha culpa, por minha máxima culpa”.

Esta maneira de viver diante de Deus é pouco sadia. Essa “culpa percusória”, além de ser estéril, pode destruir a pessoa. O individuo facilmente acaba centrando tudo em sua culpa. É a culpa que move sua experiência religiosa, suas preces, ritos e sacrifícios. Uma tristeza e um mal-estar secreto se instalam então no centro de sua religião. Não estranho que pessoas que tiveram uma experiência tão negativa um dia abandonem tudo.

Por outro lado, é bom frisar que esse caminho não leva a cura, embora não se deve eliminar o sentimento de culpa. Carl Gustavo Junga e Carlos Castilha del Pino, entre outros, nos advertiram dos perigos que a negação da culpa encerra. Viver “sem culpa” seria viver desorientado no mundo dos valores. O indivíduo que não sabe registrar o dano que está causando a si mesmo, ou aos outros nunca se transformará nem crescerá como pessoa.

Existe um sentimento de culpa que é necessário para construir a vida, porque introduz uma autocrítica sadia e fecunda, põe em movimento uma dinâmica de transformação e leva a viver melhor e com mais dignidade. O importante é saber em que Deus alguém crê. Se Deus é um ser exigente e sempre insatisfeito, que controla tudo com olhos de juiz vigilante sem que não lhe escape, a fé nesse Deus poderá produzir angústia e impotência diante da perfeição nunca alcançada. Se, pelo contrário, Deus é o Deus vivo de Jesus Cristo, o amigo da vida e aliado da felicidade humana, a fé nesse Deus produzirá um sentimento de culpa sadio e curador, que impulsionará a viver de forma mais digna e responsável. A oração que o leproso dirige a Jesus pode ser um estímulo para invocar confiantemente a Deus a partir da experiência de culpa: “Se quiseres, podes limpar-me”. Esta oração é reconhecimento de culpa, mas é também confiança na misericórdia de Deus e desejo de transformar a vida.

 

Façamos nossa oração:

Querido Pai do céu, através da leitura de Marcos em se tratando de um leproso, Jesus mostra o lado humano e divino de sua missão ao se aproximar dele. O gesto do leproso se atreveu a desafiar todas as normas. Jesus diante do leproso encarna o que Deus quer, ou seja, limpar o mundo de exclusões que vão contra a sua compaixão de Pai. Não é Deus que marginaliza, mas nós. Por isso, Jesus estende a mão e toca o leproso e lhe diz: “Eu quero. Fica limpo”. Devemos reconhecer nossas culpas, mas também confiança na misericórdia de Deus que devemos focar nossa vida, pois assim ela será transformada. Amém

 

“A responsabilidade pelo conteúdo é única e exclusiva do autor que assina a presente matéria”.

Padre Ari Antonio da Silva

Colunista l pe.arisilva@hotmail.com

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