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A fuga do General Bento Gonçalves da Silva do Forte do Mar na Bahia – Influências Maçônicas

Artigo de Celso Afonso Cavalcanti de Albuquerque Tabajara

 Bacharel em Comunicação Social – Relações Públicas – PUCRS l Consultor Especial do Instituo Gaúcho de Tradição e Folclore         

 

General Bento Gonçalves da Silva

 

A Fase da Regência no Brasil de 1831 a 1840

A volta de Dom João VI e sua Corte, não tiveram apenas conseqüências políticas, o Brasil ficou privado de suas relações maternas com Portugal tendo sido cortado o cordão umbilical. A fase da Regência (1831-1840) é uma das mais importantes da história brasileira, pois dá acabamento definitivo ao processo de independência.         Os movimentos de rebeldia do segundo período da Regência têm assim uma destacada importância.

Eles se bifurcam em dois tipos: os movimentos em que a camada média comanda, com o apoio de camadas da classe senhorial da província afetada, como no caso da revolução Farroupilha (RS) e da Sabinada (BA); e os movimentos de massas, com ou sem participação de elementos da camada média, como no caso da Guerra dos Cabanos (PE), Cabanagem (PA) e da Balaiada (MA).

Uns defenderam as idéias em moda da Revolução Francesa e outras do Federalismo Americano. As lojas maçônicas eram o fórum de debates desta idéias. As primeiras lojas maçônicas já estavam sendo implantadas em território brasileiro desde pelo menos o ano de 1800. O movimento maçônico, que crescera juntamente com a difusão das idéias emancipacionistas, chegou ao Rio Grande do Sul três décadas depois que nas regiões centrais do Brasil, com a instalação de loja no Rio grande do Sul, a Loja Filantropia e Liberdade, fundada em 25 de dezembro de 1831, na cidade de Porto Alegre.

 

Mapa da cidade de porto Alegre em 1836

 

Na década de 1830 a elite intelectual gaúcha aderiu mais intensamente e quantitativamente ao pensamento iluminista e liberal, especialmente de origem francesa, sendo possível relacionar a Revolução Farroupilha com o movimento maçônico, pois eles são, no mínimo, concomitantes e conectados no campo de idéias.  A abdicação do imperador, em 1831, assim como as primeiras medidas dos governos regenciais, suscitou um aumento da frustração por parte da elite gaúcha em relação ao governo central, e foram os integrantes dessa vertente política, os responsáveis pela organização e o surgimento do movimento revolucionário de 1835.

É neste cenário que se dá a luta de secessão do Rio Grande identificada como a maçonaria vermelha, isto é, republicana. Os Irmãos Ferreira, em seu livro “A Maçonaria na Independência do Brasil”, afirmam que os farrapos, quando tinham uniformes, os usavam da cor vermelha. No Brasão de Armas do Estado do Rio Grande do Sul, também, como se pode verificar, estão os símbolos e as cores maçônicas.

 

Brasão de Armas do Estado do Rio Grande do Sul

 

Assim foi, que as tensões entre liberais (vermelhos), e conservadores (azuis) ou caramurus, aprofundadas com os excessos imperiais relativos ao peso exorbitantes impostos, pois eram os produtos rio-grandenses vencidos pela concorrência dos platinos nos mercados gerais (o rio-grande exportava charque para as demais províncias e couros para o exterior); ao Rio Grande faltavam serviços necessários ao seu desenvolvimento, grande parte dos produtos usados era importada (vinham do exterior: fósforos, vassouras, pregos, tecidos, sapatos, acessórios, etc.), pois, como nas demais regiões do país, praticamente inexistia a indústria nacional; parte de suas vendas eram drenadas em suprimentos à Província de Santa Catarina; cancelara-se a dívida do tesouro de São Paulo ao Rio Grande, mas concedia-se àqueles impostos de introdução de animais que este para ali exportava; e, não satisfeito, o Império criava direitos vexatórios sobre os chapeados, as esporas e os estribos rio-grandenses.

 

 Mapa do Brasil

 

 O Brasil de1836 e 1837

Em 1837, o Brasil tinha por volta de seis milhões de habitantes. Vivia no regime monárquico e o poder era exercido por um regente, Padre Diogo Antônio de Feijó, uma vez que Dom Pedro II que tinha direito ao trono era ainda menor de idade. Havia escravidão dos negros e o país era dividido em quinze províncias. O Ano de 1837 foi farto de acontecimentos políticos importantes: a apresentação da lei interpretativa do Ato Adicional; a renúncia do Regente Padre Diogo Antônio Feijó – em seu lugar assume o senador Pernambucano Pedro Araújo Lima -; o aprisionamento (1836) e fuga (1837) do general Bento Gonçalves da Silva (líder farroupilha) na Bahia e o início da Sabinada (BA).

 

Batalha do Fanfa 1836

 

Em 04 de outubro de 1836, a ilha de Fanfa, no rio Jacuí, distante aproximadamente quarenta quilômetros de Porto Alegre, foi palco de um dos primeiros conflitos travados entre as tropas imperiais brasileiras e os revolucionários da República Rio-Grandense na Guerra dos Farrapos. Nesta ocasião o chefe dos farrapos, General Bento Gonçalves da Silva foi aprisionado pelo Coronel Bento Manuel Ribeiro e junto com ele outros combatentes importantes: Tito Lívio Zambeccari; Onofre Pires; Marciano Ribeiro; Pedro Boticário; Domingos José de Almeida Corte Real e José Calvet.

Dos antecedentes dessa batalha sabe-se que Bento Gonçalves, ao tomar conhecimento que Antônio Souza Neto havia obtido em 10 de setembro, às margens do arroio Seival, na região de Bagé, uma grande vitória sobre os soldados do governo – feito de suma importância que fez Souza Neto proclamar ali a independência da província rio-grandense -, suspendeu o sítio imposto à cidade de Porto Alegre e deslocou-se com seus homens acompanhando o curso do rio Jacuí, para encontrar-se com Neto.

 

Coronel Bento Manual Ribeiro

 

O Coronel Bento Manual Ribeiro, comandante das tropas imperiais, avisado do intento e do rumo que tomaria Bento Gonçalves, embarcou sua gente e foi esperá-lo na margem esquerda do Jacuí, além disso, estava protegido pela flotilha comandada por Jonh Pascoe Grenfell, oculta entre as ilhas. Chovia muito na época, os rios estavam cheios, e por isso a travessia do Jacuí deveria ser feita através da Ilha de Fanfa, no município de Triunfo. Bento Manoel, sem ser pressentido, vigiava de perto todas as manobras, aguardando a ocasião para atacar Bento Gonçalves e seus comandados.

 

Mapa da cidade de Porto Alegre em 1836

 

No dia 03 de outubro de 1836, as forças imperiais terrestres fecharam o cerco. Surpreendidos, os farroupilhas resistiram quanto puderam, principalmente porque sabiam que a cavalaria de Jaguarão, lideradas por Domingos Crescêncio de Carvalho, amigo e parente de Bento Gonçalves, não estava distante. Foi assim que eles conseguiram repelir os soldados inimigos que tentavam desembarcar na ilha. Mas nem sequer teve tempo de fazer seguir um só homem: os navios de Grenfell se apresentaram, impedindo-o. Embargados seu passos só mente lhe restava tentar romper o bloqueio, dando combate, porém foi atacado violentamente em duas frentes, novas tropas sob o comando de José Joaquim de Andrade Neves (Futuro Barão do Triunfo), engrossaram as hostes de Bento Manuel. Tal resistência teve um custo muito alto: cento e vinte mortos e duzentos feridos. Por esse motivo, naquela noite foi negociado um acordo pelo qual os farrapos capitulariam, entregariam suas armas e voltariam livres para suas casas.

 

Rendição de Bento Gonçalves e seus comandados

 

Na manhã do dia 04 de outubro de 1836 era formalizada a capitulação conforme o discutido horas antes. No momento em que a situação parecia estar resolvida, chegou ao local o almirante Jonh Pascoe Greenfell trazendo consigo o presidente da província, José de Araújo Ribeiro, e este, não aceitando o acordo feito pelas lideranças militares, ordenou a prisão imediata dos farrapos.

 

A Prisão de Bento Gonçalves

 

O General Bento Gonçalves da Silva foi enviado junto com Onofre Pires, para a prisão de Santa Cruz e mais tarde para a fortaleza de Lage, no Rio de Janeiro, aonde chegou a tentar uma fuga, da qual desistiu porque seu companheiro de cela, o também farrapo Pedro Boticário, era muito gordo, e não conseguiu passar pela janela. Enquanto preso no Rio de Janeiro conheceu o carbonário italiano Giuseppe Garibaldi, que junto com outro italiano Luigi Rosseti, chagara ao porto da capital do Império na nau francesa Noutonier.

 

Carbonário Italiano Giuseppe Garibaldi

 

Do Rio de Janeiro foi Bento Gonçalves enviado para o presídio da ilha de Fernando de Noronha. Felizmente, um desarranjo no barco que o conduzia obrigou o comandante a ficar por alguns dias na cidade de Salvador, Bahia. Enquanto o navio estava no estaleiro, Bento Gonçalves fora trancafiado no Forte Nossa Senhora do Pópulo e São Marcelo – popularmente conhecido como Forte do Mar -, em plena baía de Todos os Santos, porque se reputava mais segura alí sua prisão. Com incrível rapidez espalhou-se a notícia e a Maçonaria e amigos de Bento Goçalves resolveram agir e acertar sua fuga.

Bento Gonçalves chegou à Bahia “com ar seco,aspecto melancólico e sisudo” segundo um Jornal local. As duas prisões em que o prenderam eram insalubres e desconfortáveis conforme se conclui de carta por ele escrita: Pedia três camisas por estarem as suas em frangalhos, um capote por sentir frio a noite, pois só tinha um lençol para cobrir-se e , um par de tamancos para poder passear na masmorra em que estava preso que é toda uma lagoa cheia de imundície e de péssimo cheiro”  

 

 Carta de Bento Gonçalves escrita na prisão do Forte da Lage

 

                                 Recolhido ao Forte do Mar, Bento Gonçalves não perde tempo. Lembrou-se da Maçonaria, e em 30 de junho de 1837 era lida na “Loja Felicidade e Beneficência” uma “prancha” do irmão R.: C.: Bento Gonçalves, “preso no Forte do Mar por efeito de política, fazendo ver o estado em que se achava”. Pedia sua mudança para uma prisão salubre e cômoda, onde fosse possível falar aos amigos. Era o começo da meada.

A Maçonaria atendeu-o mandando “lhe oferecer os socorros de que precisasse e estivessem ao alcance da Loja”. O intermediário era um religioso maçom Cônego Joaquim Antônio das Mercês, que a pretexto de dar ao preso o conforto da religião, acertava o plano de fuga.

No livro “A Maçonaria na Independência”, os irmãos Ferreira afirmam textualmente: “Assim, no dia 28 de junho daquele ano na Loja “Virtude ao Oriente da Bahia” o Irmão Secretário apresentou uma prancha do Irmão Bento Gonçalves da Silva, grau 18, de que ficou a Loja ciente, logo nomeados os Irmãos Guimarães, Manoel Joaquim e Marques para se dirigirem por parte da Loja ao dito Irmão e participarem-lhe que ela ficou inteirada, e que faria o que estivesse ao seu alcance a fim de melhorar sua sorte. E no dia 30, na Loja “Fidelidade e Beneficiência”, foi lida outra prancha de Bento Gonçalves e a Loja inteirada nomeou os Irmãos, Tesoureiro e Orador Adjunto para visitarem o Irmão Bento Gonçalves e lhe oferecerem os socorros de que ainda necessitasse”

Forte de Nossa Senhora do Pópulo e São Marcelo, popularmente conhecido como Forte do Mar

 

A Fuga de Bento Gonçalves

E logo a 11 de setembro de 1837, pedindo licença para banhar-se no mar, Bento Gonçalves alcançou uma canoa posta próxima ao forte. Oito remeiros a aceleraram para o recôncavo. Era a fuga! Abrigou-se na ilha de Itaparica, e poucos dias depois tornava à capital baiana, desenvolvendo sua ação revolucionária articulando a rebelião do sul com um movimento na Bahia, que era sua ambição. Pôs-se à campo, argumentou, animou e convenceu, o terreno lhe era propício.

 

Medalha da República Riograndense cunhada depois de 1936

 

Aproximando-se dos revolucionários baianos, Bento Gonçalves procurou mostrar a inconveniência de estar aquela Província sujeita ao Governo do Regente do Império, convinha que a Bahia fizesse o mesmo que o Rio Grande.  Esta sugestão agradou e se foi estendendo por todos que adotavam as idéias liberais, entre eles, seu grande lider o médico Doutor Francisco Sabino A. da Rocha Vieira – foi ele a alma e o cérebro da revolução que tomou seu nome “A Sabinada” – e o Ten. Cel. Francisco José da Rocha que, pessoalmente participou da libertação de Bento Gonçalves e que este, mais tarde, o acolheria no Rio Grande finda a Sabinada, fazendo-o comandante de um batalhão de infantaria farrapo e a mais alta autoridade Maçônica do Rio Grande.

Dias depois, Bento Gonçalves foi embarcado em um navio que transportava farinha de trigo destinada à Pelotas e Montevidéu. Foi desembarcado em Florianópolis. Dali, a cavalo, seguiu em companhia do catarinense “Matheus”. Em 03 de novembro de 1837 pisava em terras gaúchas atingindo Torres (“Tive a satisfação de pisar neste país abençoado”, escreveu a um amigo) e em 10 de novembro de 1837 atingiu Viamão, Quartel General da Divisão do Centro do sítio terrestre de Porto Alegre sob o comando do General Onofre Pires e a 16 de  dezembro, em Piratini, tomava posse da Presidência da República, conforme fora eleito. Estava assim consumada sua liberdade!

 

Bandeira do Estado do Rio Grande do Sul

 

Considerações Finais

A íntima relação da primeira loja maçônica e o gabinete de leitura “O Continentino”, balizou como primeira forma de atuar da maçonaria no Rio Grande do Sul. Os maçons atuavam com extrema discrição em virtude do caráter sigiloso da instituição, pois buscavam proteger-se da perseguição política e/ou religiosa que sofreram. Foram os “gabinetes de leitura” os embriões maçônicos.

No transcorrer da revolução outras lojas foram fundadas, entretanto nem todas favoráveis aos farroupilhas e sim aliadas dos imperiais, como as Lojas União e Fraternidade situada em São Leopoldo e a Loja União Geral, situada na cidade de Rio Grande, onde foi iniciado o Marquês do Herval, Manoel Luis Osório, que na primeira fase da revolução participou ao lado dos farroupilhas.

 

 

Símbolo da Maçonaria

 

 

Bibliografia:

FRANCO, Afonso Arinos de M. – “Um Soldado do Reino e do Império” – RJ/BIBLIEx. 1942

BLACKE, Sacramento- “A Revolução da Bahia de 07/11/1837” Tomos 42,8 parte 1885 e 50,2ª

DANNEMANN, Fernando Kitzinger – “1836 Batalha do Fanfa” (RGSul)

VIANNA FILHO, Luiz A. – “A Sabinada” – Rio de Janeiro. Ed. José Olympio, 1946

FERREIRA, Manoel Rodrigues e Tito Lívio – “A Maçonaria na Independência Brasileira”

Editora e Gráfica Biblos Ltda. – 1968

BORJA, Sérgio Augusto Pereira de – “A Revolução Farroupilha no Cenário Mundial de Sua

“Época e o Papel da Maçonaria” – 1994

COLUSSI, Eliane Lucia – “A Relação entre a Revolução Farroupilha e a Maçonaria”
SPALDING, Walter – “A Epopéia Farroupilha” – BIBLIEx. 1963

 

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