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Colunista l casagrandegilneiricardo@gmail.com

Nayr Adelina Perini, a mulher que criou o ‘Caderno de Boas Maneiras’ na Linha 28

Nayr Adelina Perini, nasceu no dia 19 dezembro de 1930. Criada num ambiente sem ter muitas opções, dividiu a casa paterna com mais onze irmãos num universo de nove mulheres. Foi a 5ª filha de Angelina e Francisco Perini, moradores da Linha 28, colônia mais próxima do centro da cidade de Gramado. Pelo que se infere estava convencida de que chegara a hora de somar às regras da educação que recebera de seus pais e se aproximar das regras que disciplinam a etiqueta social, normas hoje ofegantes face a liquidez das relações sociais. É aqui que nasce o “Caderno de Boas Maneiras”.

 

Foto da capa do Caderno de Boas Maneiras. Data: 1972.

 

Nayr era uma mulher esguia para os padrões de sua época.  Tinha um jeito peculiar de falar. Não raras vezes utilizava as mãos, como seu pai, para enfatizar as palavras cuja sonoridade  era um “mix” entre o português e o dialeto italiano o que lhe dava um ar singular.

 

Cena: jogo de boliche/bolão. S.R.G – Anos 60.

 

Por onde andava era notada, tinha uma vaidade natural, despretensiosa, condizente com sua origem. Foi uma das primeiras mulheres de Gramado a dirigir, fosse na direção de uma Rural Wyllis ou numa veraneio cabine dupla a elegância não a abandonava. Os homens a respeitavam o que dava a ela a segurança de chegar numa borracharia sem ser molestada por alguém. Era hábil nas contas de juros, cuidou das finanças da Vinícola Perini até seu encerramento nos anos oitenta. Tudo era anotado.

 

Caderno de anotações. Data incerta.

 

Sua devoção a Deus e ao bem do próximo era exemplar e esses códigos de conduta a acompanharam até a hora derradeira.

Nayr era uma coletora. O que chegava às suas mãos, guardava. Foi dentro de uma das várias caixas de fotografias e outros documentos que localizei o Caderno de Boas Maneiras. Algo inusitado, uma radiografia dos traços da personagem que vale a pena examinar.

 

Orientações convite Casamento. Data: 20.11.72

 

Os registros vão de novembro a dezembro de 1972. Durante este período tudo o que a personagem pode transcrever, está neste caderno (infere-se que as lições de etiqueta social eram transmitidas por alguma estação de rádio. Em alguns casos, entre uma linha e outra há uma linha em branco o que se presume a escrita de algum complemento posterior à audiência).

 

Escreveu ela:

“Boas maneiras não é senão um conjunto de deferências baseadas no princípio do respeito mútuo que devemos a nós mesmos. Ajuda a corrigir uma série de dissabores e de ressentimentos decorrentes dos diferentes tipo de personalidades dos indivíduos obrigados ao convívio diário com seus semelhantes”

 

Logo abaixo, lê-se:

” As boas maneiras não surgem de fatores materiais, tem sua origem na formação espiritual do homem pois é no seu interior que está este principio de respeito a si e de respeito aos outros os quais  edificam as civilizações”.

 

Seus escritos passam pelo serviço de Almoço/Jantar Americano, aniversário de quinze anos, aniversário de crianças entre outros. No dia 28 de novembro há um registro ” Boas Maneiras na Praia”, Boas maneiras no Campo  e Boas Maneiras em Estações de Águas” (29.11.72).

No dia 30 de novembro de 1972, consta no caderno de anotações “Entrevista para Pedir Emprego”.

Nayr viajou por universos que lhe habilitaram como comer ostras, alcachofras, carne de rã entre outras especiarias assim como aprendeu várias dinâmicas na composição de cardápios e na harmonização de vinhos.

[…]

 

Pergunto-me: – Quais os motivos que levaram a personagem a se aproximar destas regras sociais? Teria ela sido provocada pela necessidade?

Há vários sinais: A Vinícola Perini tornara-se uma referência no mercado de vinhos. Neste período a hotelaria crescia assim como os restaurantes, as malharias e os artesanatos. Inegavelmente a chegada do Festival de Cinema na década de 70 contribuiu para que as mudanças, entre elas comportamentais, ocorressem. O colono, paulatinamente passou a ser visto com outros olhos quando a Festa da Colônia se torna um atrativo turístico, incentivado pelo poder público a partir de 1985. Antes a situação era outra bem diferente da que é hoje.

Certo ou não Nayr foi uma mulher que soube dividir seu tempo entre a “visibilidade” que a cidade oferecia com as estrebarias e galinheiros, entre o salão de beleza da “Juracy”  com as pipas onde verificava a “graduação” do vinho, período vital da vinificação, são alguns  exemplos.

 

Nayr com sua hortênsia japonesa. Ano:2009

 

O dia em que vasculharmos as gavetas do passado encontraremos mais personagens como Nayr. E, se soubermos colocá-las lado a lado, legaremos as próximas gerações um “longa metragem” recheado de atitudes, tornando a cidade ainda mais humana, acolhedora e hospitaleira, afinal as regras sociais nasceram com o propósito civilizatório.

 

Por enquanto, temos que nos contentar com meros flash.

 

Casagrande

 

“A responsabilidade pelo conteúdo é única e exclusiva do autor que assina a presente matéria”.

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